sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Broken Age: Ato 1 - Análise



Depois de aproximadamente 2 anos, 3 milhões de dólares e 87 mil backers, podemos finalmente  jogar o tão aguardado Broken Age (bom, pelo menos metade dele). E definitivamente valeu a espera.


Depois de muito tempo sem lançar um adventure point-n-click, Tim Schafer volta para a área que é sua especialidade sem perder a manha, fazendo parecer que foi ontem que fez um último jogo desse estilo, e não há vinte anos atrás.

E apesar de não ser muito bom com dinheiro, se enrolando na hora de aplicar os três milhões ao escopo do seu jogo, Tim mostra que não está de brincadeira e prova que o gênero não morreu!


A História


O Ato I começa a contar a saga parelela de Shay e Vella.

Shay é um menino que mora em uma nave com seus pais, que na verdade são parte do computador de bordo, a inteligência artificial da nave. Shay vive uma rotina tediosa, convivendo com a "mãe" super-protetora, que ainda o trata como uma criança, proibindo qualquer atividade que não as especificadas por ela: que são geralmente brincadeiras infantis disfarçadas de missões (não tanto assim, já que não mais enganam Shay), como salvar homenzinhos de tricô de uma avalanche de sorvete, por exemplo. Mas Shay não vai aguentar essa situação por muito mais tempo...

Shay em sua nave. (Clique para ampliar)
Em um vilarejo, a menina Vella foi uma das escolhidas para servir de sacrifício para a grandiosa besta Mog Chothra, o que é uma grande honra e orgulho para sua família. Sacrifícios são oferecidos periodicamente para a criatura, que alimentada, não volta sua ira contra a vila. Apesar da família toda estar orgulhosa de Vella ter sido escolhida, ela não consegue aceitar seu destino, mas não pode recusá-lo, com medo da represália do poderoso monstro.

Vella na cidade flutuante de Meriloft. (Clique para ampliar)

Apesar de viverem em realidades tão diferentes, a história de Shay e Vella tratam de temas comuns como solidão e amadurecimento.


Em Broken Age, nada está quebrado


Apesar do tom bem mais leve (em contrapartida com o sério Full Throttle ou o macabro Grim Fandango), como todo jogo escrito por Tim Schafer, aqui o humor está presente. Mas diferente dos anteriores, em Broken Age ele não é tão exagerado. Apesar dos momentos cômicos serem tão abundantes quanto em seus títulos passados, aqui ele se dá de maneira mais sutil e balanceado com momentos mais sérios.


Para mim, o mais incrível do Tim são os universos loucos que saem de sua mente como a Terra dos Mortos em Grim Fandango, ou o Mundo Heavy Metal de Brütal Legend, e os personagens que os compõe. E essa façanha é repetida mais uma vez. O universo de Broken Age é tão complexo e verossímil que parece que ele sempre esteve lá, mas só agora foi descoberto por nós.
E o que seria desse universo sem seus personagens? Pois os mais criativos e bizarros estão presentes aqui: desde um Guru duvidoso, até um lenhador que tem medo de árvores...

Um dos excelentes personagens do jogo: Curtis, o lenhador. (Clique para ampliar)

Não tem como falar dos personagens sem falar dos atores por trás deles. Muita gente reclamou do fato de grandes estrelas de Hollywood estarem sendo contratadas para o jogo, com medo disso acabar com o orçamento. Mas o pessoal da Double Fine sabia o que estava fazendo, e nomes como Jack Black, Elijah Wood, Wil Wheaton, Pendleton Ward (criador de A Hora da Aventura) e outros, foram responsáveis por uma das melhores dublagens que vejo há muito tempo em jogos (seja adventure/point-n-click ou não).

O sistema de gameplay é bem simples, e o clique contextual dispensa os verbos. Para utilizar qualquer item basta arrastá-lo para onde desejar, de seu inventário. Inventário que assim como a interface em geral, é bem minimalista e agradável, de modo que todo o foco do jogador fica inteiramente voltado para o jogo em si.

O inventário minimalista e discreto. (Clique para ampliar)

Um dos pontos mais incríveis do jogo é seu estilo visual, que imita pintura a óleo. Confesso que a princípio, vendo as artes conceituais e algumas capturas de tela do estágio inicial do jogo no fórum da Double Fine, não fui muito com a cara do estilo. Achei que preferia uma pegada mais cartunesca (como em Deponia). Mas assim que comecei o jogo engoli minhas palavras e fiquei de queixo caído: era ainda mais bonito do que nos trailers! Os efeitos de iluminação conseguiram embelezar ainda mais, criando um visual que arrisco dizer ser único na indústria.

Não destoando da arte do jogo, a trilha sonora não fica para trás. A antiga (e constante) parceria entre Tim Schafer e Peter McConnell continua em Broken Age. A trilha do jogo consegue ser maravilhosa ao mesmo tempo que é muito heterogênea. Ela não segue um estilo único, já que a música se transmuta junto com os cenários e contextos do jogo. No vazio espacial em que habita a nave de Shay, a música de fundo se mescla perfeitamente. No vilarejo de Vella, uma música de estilo totalmente diferente da anterior (como se tirado de outro jogo) consegue o mesmo nível de imersão. É possível encontrar músicas de vários tipos no decorrer do jogo, inclusive umas que lembram country e caribenhas.

Como sempre, Peter mantém o trabalho em um nível altíssimo. Para quem não ouviu falar, esse é o mesmo cara por trás da trilha sonora de jogos como: Full Throttle, The Dig, Psychonauts e o insuperável Grim Fandango (que deve grande parte do seu sucesso à sua trilha sonora).

Texturas que lembram pinturas e iluminação incrível. (Clique para ampliar)

O design dos puzzles do jogo é bem feito, são soluções interessantes e não muito difíceis, fazendo com que o jogador não tenha que esquentar muito a cabeça para resolver, mas que também não sejam de solução instantânea. Acredito que a equipe da Double Fine tenha conseguido um bom equilíbrio, conseguindo redimir o passado de Tim com quebra-cabeças obscuros, em sua época de LucasArts. Qualquer dificuldade ou dúvida pode ser sanada através dos diálogos no jogo, que dão algumas pistas do que fazer a seguir, substituindo de maneira perfeita qualquer sistema de dicas.

Uma mecânica que parece não ter muita utilidade no fluxo desse primeiro ato é a possibilidade de trocar entre Vella e Shay a qualquer momento. Porém isso é de extrema utilidade em jogos que exigem raciocínio mental e resolução de desafios. Apesar de não serem dos mais complicados, é chato ficar muito tempo empacado em um puzzle. E depois de tentar e tentar, a tendência é que o jogador pare de jogar ou procure a solução na internet. Não em Broken Age. Se você estiver travado, basta trocar de personagem e esfriar a cabeça enfrentando outros obstáculos. Tenho certeza que quando você voltar ao personagem preso, vai rapidamente resolver a situação :)

Estão tendo alguns relatos de bugs e reclamações com a campanha de apenas 4 horas do primeiro ato, mas acho que seria injusto incorporar esses como pontos negativos já que o jogo está em beta no momento que escrevo esse texto, e essas foram uma das mais bem gastas 4 horas da minha vida gamer. Mas é tão bom, que a sensação de quero mais - principalmente depois do clímax final - é óbvia. 

Conclusão


Tim Schafer acerta novamente 20 anos depois: Um universo rico com personagens complexos (e uma das melhores dublagens dos últimos tempos), design dos puzzles feitos de maneira inteligente e balanceada, estilo visual único e um roteiro Schaferiano com a qualidade de sempre. Apesar de incompleto, o final excelente do primeiro ato deixa a ansiedade no ar.

E é com essa sensação nostálgica que a Double Fine prova não só que o gênero adventure não está morto, mas também que ele ainda está, depois de todos esses anos, em processo de evolução.















Trailers




Ficha técnica:


Título: Broken Age
Plataforma: Android, iOS, Linux, OS X, Windows, Ouya
Desenvolvedor: Double Fine Productions
Publisher: Crowdfunding (Kickstarter)
Publisher: Daedalic Entertainment
Gênero: Adventure / Point-n-click
Lançamento: 14 de janeiro de 2014 (para backers) / 28 (para público geral)

Broken Age pode ser comprado na Steam (até o dia do lançamento com 10% de desconto)